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Os obstáculos da construção civil para 2017

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Crise

Os obstáculos da construção civil para 2017

Ceramistas comentam medidas anunciadas pelo novo governo e cobram mais ações para a indústria de cerâmica vermelha

Por Mellyna Reis

Um dos setores que mais gera empregos no país é também um dos que mais vêm sofrendo com a crise econômica nacional. A construção civil tem sofrido com a redução dos investimentos dos últimos três anos, fazendo com que o setor amargasse com a alta taxa de desempregados: mais de 3,6 milhões de pessoas foram demitidas entre os anos de 2014 e 2015, segundo os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), totalizando 435 mil postos de trabalhos extintos no acumulado.

Com as mudanças no governo federal, que acabam por refletir diretamente na economia, os empresários deste setor vivem angustiados para saber quando vai acabar a recessão na construção civil. Algumas pastas, como o Ministério das Cidades e Fazenda, anunciaram medidas para reaquecer a economia, entre elas, a retomada de obras do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) que estavam paradas, o lançamento dos cartões Reforma e Construcard, abertura de linhas de créditos e flexibilização de regras e prazos, visando impulsionar as operações de produção e contratação de unidades habitacionais.

Contudo, os empresários da cerâmica vermelha ainda aguardam medidas mais específicas para o segmento, que representa 4,8% da indústria de construção civil. “Por enquanto, ainda não teve impacto nenhum porque, na prática, as medidas ainda não aconteceram”, analisa Luis Lima, diretor da área de Blocos e Tijolos cerâmicos da Anicer. O ceramista, que é sócio da Argibem, localizada em Três Rios/RJ, defende que o Minha Casa, Minha Vida é o único carro-chefe capaz de trazer melhorias ao setor. “Mesmo com um volume muito menor do que tínhamos antes, espero que o programa seja um alavancador dessa recuperação, pois a realidade é muito diferente. O dinheiro para reforma [dos cartões Construcard e Reforma] é ineficiente pra gente”, critica Lima.

O ceramista Edézio Gonzales Menon, 1º tesoureiro da Anicer, também espera ações mais contundentes da nova equipe do governo. “As medidas foram até boas, mas podiam ser bem melhores, pois tem algumas coisas que serão gradativas, como a multa de 10% para o FGTS. De um modo geral, queremos incentivos para a construção civil, para o Minha Casa, Minha Vida e para as grandes construtoras voltarem a construir e ajudarem, não só o setor cerâmico, mas toda cadeia da construção”, enfatiza. “Esperamos que 2017 seja de muitas realizações para ver se esse marasmo na economia passa”, complementa.

Os efeitos da estagnação nos canteiros de obras atingiram todas as regiões do país. “Aqui, as perspectivas não são boas. Não há movimentação de novas obras, está tudo muito parado, o pessoal está com receio de investir. O mercado retraiu de uma forma que, infelizmente, as nossas perspectivas não são boas”, lamentou a sócia-proprietária da Argiblocos, Eliane Martins Simi. A empresa, localizada em Várzea Grande, no Mato Grosso, está inativa e com um estoque de tijolos, blocos e canaletas, produzidos ao longo de 1 ano e 3 meses, encalhado. Enquanto tocam a produção em outras duas unidades, os proprietários decidiram aproveitar o momento difícil para investir na empresa, visando obter resultados a médio e longo prazo.

“A gente ainda acredita que, depois que passar toda essa turbulência, logo que as coisas melhorarem, devemos já estar preparados”, considera Eliane, ao justificar a compra de um secador de talisca para resolver um problema da fábrica. “O nosso secador estrangulava a produção. O novo equipamento funciona muito bem, só tem uma questão de ajuste para a nossa realidade. O secador deve começar a funcionar lá para abril, já que leva cerca de três meses para instalar o equipamento”, conta.

Investir em capacitações e planejamento é uma das alternativas apontadas pelo presidente do Sindicato das Indústrias de Cerâmica Vermelha para Construção do Rio Grande do Norte (Sindicer/RN), Vargas Soliz Pessoa. Mesmo com as dificuldades previstas para este ano, principalmente para a região Nordeste, o ceramista acredita que os empresários podem criar oportunidades. “A nossa indústria passa por um momento de utilização de ações sustentáveis como ferramenta de negócios, além das inovações tecnológicas, e o empresário que se inteirar de todas essas novidades e ferramentas pode dar uma boa alavancada em sua produção e em seu negócio”, analisa.

O que dizem os especialistas

A drástica queda nos investimentos em infraestrutura é o que explica a retração do emprego na construção civil. Analistas entendem que a retomada, no entanto, deve ser moderada, a julgar pela magnitude e pela difusão na recuperação dos indicadores.

Pesquisadores da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (FEE/RS) relatam que houve um aumento tímido da produção de insumos típicos da construção (cerâmica, aço, etc.) e de bens de capital destinados ao setor no estado, mas o número de unidades habitacionais lançadas em Porto Alegre manteve a queda e o nível de emprego formal na capital gaúcha permaneceu caindo até agosto (-3,3%). Confira abaixo as expectativas do pesquisador em economia da FEE/RS, Jéfferson Colombo:

Quando o fim da recessão econômica deve chegar para a construção civil?

A recessão que o Brasil vive hoje – e que foi iniciada lá no longínquo 2º trimestre de 2014, portanto próxima de completar 3 anos – é de difícil saída, uma vez que é consequência de uma política econômica equivocada e que paulatinamente gerou perda de dinamismo para a economia doméstica. É uma situação muito mais complicada do que seria caso a recessão fosse causada por fatores externos, mas cujo mercado interno estivesse pujante. Essa reflexão é importante para se pensar não só quando, mas como o Brasil sairá desta crise. No que tange à indústria da construção, os indicadores tipicamente antecedentes sugerem que 2017 será mais um ano difícil. A baixa capacidade de absorção de unidades ofertadas continua freando o lançamento de novas unidades no mercado imobiliário, algo que se observa em importantes centros como São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Já a área em construção em estágios iniciais das obras, como fundações e estruturas, que pressupõem atividade econômica futura no setor, também encerraram o ano de 2016 em forte retração, conforme dados recém-lançados do Monitor da Construção Civil (MCC, Tendências Consultoria). Este diagnóstico, igualmente percebido na intenção de investimento dos empresários (dados da CNI) e no saldo das operações de crédito destinadas ao setor (que acumula queda real no ano, apesar de um leve aumento em novembro, conforme dados do BCB), mostra o quão desafiadora é a conjuntura atual. O cenário mais provável é que o setor volte a crescer ao longo de 2017, mas não por uma recuperação efetiva do mercado, e sim porque a base de comparação é muito baixa.

As medidas anunciadas pelo governo Temer são suficientes para reaquecer o setor? Por quê?

A iniciativa de propor medidas de estímulo ao setor e a toda economia é importante, especialmente diante do atual cenário, porém destaco três pontos que devem ser observados. Primeiro, a situação fiscal fragilizada do governo geral, fruto da política fiscal pró-cíclica realizada no Brasil em anos anteriores, impede que medidas mais impactantes de estímulo sejam formuladas pelos gestores públicos. Segundo, e como decorrência do primeiro ponto, o impacto das medidas anunciadas pelo Governo Federal no final de 2016 tende a ser limitado, uma vez que a magnitude dos incentivos é modesta diante do tamanho da recessão, que já fez o PIB brasileiro encolher quase 8%. Terceiro, o problema brasileiro é muito mais grave do que mera insuficiência de crédito. Por exemplo, a proposta de aumento da oferta de crédito para o setor da construção é salutar, porém esta medida pode não apresentar os efeitos desejados porque as pessoas físicas estão com emprego e renda em declínio, além de estarem postergando decisões de investimento devido à incerteza na renda futura. A mesma situação ocorre com as empresas, que deixam de investir não somente por indisponibilidade de crédito, mas porque as condições de demanda atual e futura tornam diversos projetos de investimento inviáveis. O governo está correto no sentido de propor reformas microeconômicas, porém, infelizmente, seus efeitos tendem a ser maiores no médio e longo prazos, e a capacidade de propor medidas de estímulo de curto prazo compatíveis com a magnitude da recessão esbarra no problema fiscal.