Carlos Marun
Natural de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, Marun é formado em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e em Direito pelo Centro Universitário de Campo Grande, foi secretário municipal de Assuntos Fundiários da Prefeitura Municipal de Campo Grande; Diretor Presidente da Empresa Municipal de Habitação (EMHA) da Prefeitura Municipal de Campo Grande; secretário de Estado de Habitação e das Cidades de Mato Grosso do Sul; presidente da Associação Brasileira de Cohabs (ABC) e Agentes Públicos de Habitação; presidente do Conselho Estadual das Cidades de Mato Grosso do Sul e presidente do Fórum Nacional de Secretários de Habitação e Desenvolvimento Urbano. Hoje, o deputado federal filiado ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) é o presidente da comissão especial na Câmara que irá discutir a reforma da Previdência Social proposta pelo governo do presidente Michel Temer.
Por Manuela Souza | Fotos: Roque de Sá – Agência Senado e Antonio Augusto – Câmara dos Deputados
Que motivos levaram o governo a propor esta reforma da Previdência?
O novo governo brasileiro que chegou ao poder, em função da deposição do governo anterior, faz uma opção clara pela responsabilidade fiscal no lugar de incentivar o populismo fiscal. Esse governo tem a mais absoluta consciência de que o governo não produz dinheiro, quem produz é a sociedade. O governo se apropria de partes desses recursos produzidos pela sociedade, para o cumprimento e pagamento das suas funções e obrigações e entende que não é justo e nem producente, que não há futuro no Brasil se nós continuarmos simplesmente permitindo que gastos públicos se elevem e que o governo corra na sociedade, pedindo mais impostos para que a conta seja paga. Essa é fundamentalmente a questão. Nós tínhamos três opções diante da grave crise econômica na qual o Brasil estava e ainda está mergulhado, mas estava de uma forma mais aguda. No momento em que o nosso governo, o governo do presidente Michel Temer chegou ao poder, tínhamos uma grande inflação, cerca de 10%. Uma recessão absurda, beirando os 4%, pelo segundo ano consecutivo, o segundo ano de déficit e a maior crise econômica da história do país. Uma crise que misturava, na pior das receitas, alta inflação com recessão econômica e, diante disso, nós optamos por uma responsabilidade fiscal que devolvesse a confiança de empresários e consumidores e que pudesse fazer o Brasil voltar a crescer, ou seja, elevada inflação, elevadíssima recessão, déficit fiscal de 170 bilhões de reais e milhões de desempregados. Foi nesse ambiente que assumimos o poder. Optamos pela responsabilidade fiscal e, neste ambiente, nós tivemos que ter coragem também. Nós já tratamos da questão do aumento dos gastos públicos, estabelecendo o teto através da PEC 255, quando tramitou na câmara, já estabelecemos esse teto e agora temos que enfrentar a questão da Previdência. Por isso, o governo toma essas atitudes.
Como o senhor avalia a questão da idade mínima? Acredita que em um país com tantas desigualdades sociais e regionais é possível a definição de idade mínima para todos? Existem regiões no Brasil onde a expectativa de vida é de 64 anos. Como essas pessoas se aposentarão?
As desigualdades regionais do Brasil são profundas, mas elas não interferem de maneira muito incisiva na questão da sobrevida. É verdade que algumas regiões têm uma expectativa de vida menor do que outras, mas é porque levam em consideração a mortalidade infantil. A mortalidade infantil é considerada nesse cômputo. Porque se você analisar sobrevida a partir dos 65 anos, ela é praticamente igual para todas as regiões do país. A diferença de um ano, vai de 82 a 84 anos as diferenças regionais. Então, é sim possível que regionalmente, geograficamente, seja estabelecida a mesma idade mínima para aposentadoria, devendo, no meu modo de ver, ser consideradas as diferenças e particularidades de alguns tipos de atividade.
Para o trabalhador se aposentar com o benefício integral, seria preciso ter 49 anos de contribuição, para isso, muitos terão que trabalhar com mais de 70 anos. Como o senhor vê essa questão?
Primeiro, nós temos que dizer a verdade: aposentadoria integral, hoje, já não existe! Nós temos um fator previdenciário que reduz o valor a ser pago nas aposentadorias. Então, os 49 anos, na verdade, estão sendo utilizados por aqueles que são contra a reforma, de maneira eficiente. O que vai prevalecer é a aposentadoria aos 65 anos, com 25 anos de contribuição. Com o atingimento dessas duas exigências, o cidadão vai poder se aposentar e vai receber 76% do valor dessa integralidade, que não mais existe. O que é o normal? 65 anos, o normal é que você contribua por 35, trabalhando 65. Contribuindo por 35 anos, você vai ter uma aposentadoria de 86% desse valor, o que na verdade, é bem maior do que o que acontece na maioria dos países do mundo, quando se considera valor de aposentadoria e valores dos salários na ativa.
A reforma tem sido criticada, segundo especialistas, por penalizar os mais pobres. Isso de fato ocorre?
Eu não vejo uma penalização dos mais pobres, eu vejo uma exigência de sacrifício de todos, principalmente no que tange a necessidade de termos, todos, que trabalhar mais. Felizmente, nós estamos vivendo mais, felizmente a nossa expectativa de vida já ultrapassa os 75 anos, então, se nós vamos viver mais, nós temos que trabalhar mais. E, efetivamente, é isso o que vai acontecer para todos, então eu não vejo uma penalização dos mais humildes, ao contrário, eu vejo hoje os humildes já se aposentando com 65 anos e a média de idade de aposentadoria abaixo dos 60, ou seja, tem gente aí boa se aposentando com 52, com 53, 50, e essa aposentadoria precoce tem que ser combatida no país.
Em sua opinião, quais pontos sofrerão modificações no texto?
Eu, como presidente da comissão, tenho dificuldade em adiantar isso. O que eu posso dizer é quais são os pontos que hoje são mais polêmicos. Eu diria que a transição é polêmica, a questão do trabalhador é polêmica, a questão de algumas aposentadorias especiais é polêmica e a questão do benefício da prestação continuada, o BPC, ela também é polêmica.
Essa reforma acaba com o déficit na Previdência?
Não! Não acaba com o déficit da Previdência. Ela diminui o crescimento do déficit. Ela não acaba nem o crescimento do déficit, ela diminui o ritmo desse crescimento, por aí vocês veem o tamanho do problema. E nós temos que ter a absoluta consciência de que o dinheiro que cobre o déficit da Previdência, ele é retirado da educação, é retirado da saúde, é retirado da assistência social, é retirado dos demais investimentos, é retirado da segurança, é retirado da habitação, ou seja, nós temos que equacionar a questão da nossa previdência, adequando-a à nova realidade brasileira, até para que setores importantes do país não sejam demasiadamente penalizados por esse déficit.
Há quem diga que o governo mente quando diz que a Previdência é deficitária. O que o senhor acha desta colocação?
Não é que eu acho, eu tenho certeza de que a Previdência é deficitária. Até porque isso é óbvio ululante. A partir do momento que nós estamos hoje vivendo, em média, 76 anos e que estão nascendo 1,7 filhos, por mulher, é óbvio que a pirâmide demográfica do país está deixando de ser uma pirâmide e já é um retângulo e a tendência é que se transforme em um trapézio invertido, ou seja, cada vez menos gente trabalhando para sustentar os aposentados. Numa situação como essa, não há como não ter déficit, por isso que eu digo que o déficit vai continuar. O que nós estamos tentando é amenizar o crescimento desse déficit e, eu repito, para que o país possa avançar. Não existe país no mundo que possa crescer, se de cada 2 reais que arrecada, 1 é destinado ao pagamento da sua seguridade social.
Quando vai ser incluída a análise das aposentadorias já existentes e a reavaliação de auxílios como, por exemplo, prisão?
Essa questão do auxílio preso é muito polêmica e até revoltante para muitos, muitos ao qual eu me incluo. Eu concordo que é uma situação que revolta e ela tem que ser analisada sob dois aspectos. Talvez o auxílio prisão deva ser retirado da questão previdenciária, mas nós temos também que ter em mente uma realidade: se nós não tentarmos cuidar, pelo menos um pouco, dos filhos do bandido preso, quem vai cuidar são os bandidos soltos. E, na verdade, nós vamos estar criando grandes fábricas de bandidos, se nós simplesmente tomarmos este tipo de atitude. E essas crianças, que podem ainda ser resgatadas para uma cidadania plena, terão toda a probabilidade de se transformarem, também, em bandidos. Esse assunto tem que ser tratado com menos pirotecnia e com mais razão.
E a análise das aposentadorias das filhas de militares, como fica esta questão?
Isso já está ultrapassado! Essa situação já foi resolvida, não existe mais em relação aos militares que há mais de 10 anos ingressam nas forças armadas.
Está prevista a revisão dos gastos com aposentadorias de deputados, senadores, enfim, políticos? Qual o embasamento para elas, visto que é uma prestação de serviços temporário? O tempo de contribuição deles conta em qual formato de cálculo?
Tem que contar! É óbvio que a partir do momento que você está trabalhando na atividade parlamentar, tem que contar aquele tempo, já que você está contribuindo com o parlamentar, tem que contar para a aposentadoria. É até ridícula qualquer afirmação no sentido contrário. O que nós podemos garantir é que o que vai valer para os cidadãos em geral, vai valer também para os agentes políticos.
E a revisão da aposentadoria dos magistrados, tribunal de contas, cargos públicos com desvio de função? Como ficará esta questão?
Mesma resposta que eu dei no quesito anterior vale para esse. Nós temos que acabar com essa situação dos privilégios. Todos têm que ter uma idade mínima para se aposentar e o que vale para um, tem que valer para todos.
Quais as chances da proposta passar no Congresso da forma que está?
Nenhuma! Vão haver alterações. É óbvio que precisamos realizar na câmara dos deputados, no parlamento e no senado um grande debate a respeito do assunto, é óbvio que muitas das sugestões apresentadas pelos senhores e senhoras parlamentares, a partir de tudo o que estamos ouvindo e do debate que está estabelecido na sociedade, é óbvio que muitas dessas propostas serão agasalhadas pelo texto final. Todavia, o que é importante é que a reforma não pode perder a sua espinha dorsal, que é mais sustentabilidade.
Qual a previsão para que essas mudanças entrem em vigor?
Nós estamos tentando aprovar essa PEC ainda no primeiro semestre, e ela passará a ter vigor imediatamente após, aí estabelecido um tempo de transição. Tempo de transição este que está estimado em 15 a 20 anos.
O senhor gostaria de falar mais alguma coisa?
O presidente Temer está tendo a coragem necessária para propor essas reformas significativas. Todos fizeram reformas, o Fernando Henrique Cardoso propôs e fez uma minirreforma, o Lula fez uma minirreforma, a Dilma estava pensando em uma minirreforma. Quem está tendo coragem de propor uma reforma real e que possa produzir resultados é o presidente Temer. A diferença entre esses todos, é só a coragem. Todos sabem que é necessária a modernização da nossa Previdência e penso que nós não devemos perder esta oportunidade.