Luiz Sérgio Franco
Engenheiro Civil, Mestre e Doutor em Engenharia Civil, Luiz Franco é professor e pesquisador da Escola Politécnica da USP desde 1986, atua na área de tecnologia da construção de edifícios, racionalização e alvenaria estrutural e de vedação. É sócio-diretor da Arco Assessoria em Racionalização Construtiva, especializada em projetos de vedação vertical, alvenaria estrutural e revestimentos.
Por Manuela Souza
Na sua opinião, o que é indispensável em um projeto?
O que é realmente indispensável em qualquer projeto é que ele tenha como foco a facilitação da execução, seja um projeto de vedação ou um projeto em alvenaria estrutural. O projetista deve ter a visão mais ampla possível e não apenas resolver os problemas técnicos que são inerentes ao projeto, mas realmente tentar entender quais são as necessidades e desafios que o executor irá enfrentar e buscar auxiliar nesses desafios. Um projeto não é necessariamente igual ao outro, as soluções e tecnologias vão variar em função da obra e do executor.
De acordo com a sua experiência, quais as maiores vantagens e desafios em trabalhar com blocos cerâmicos?
O primeiro desafio é fazer todos entenderem a necessidade de trabalhar com materiais certificados que atendam aos padrões normativos. Isso é básico. Num mercado tão diverso e tradicional como o da alvenaria cerâmica encontramos produtos que vão de um extremo à outro, de materiais com excelente qualidade a outros que, para apresentarem preços mais convidativos, acabam por não cumprir todas as exigências necessárias. O usuário tem que entender que quando compara componentes nesta situação, não são os mesmos componentes. O bloco de qualidade tem uma série de vantagens, que podem incorporar às paredes tanto características desejáveis de desempenho, como permite a aplicação na alvenaria racionalizada, com grande potencial de ganho de custos e qualidade. Aliás, a alvenaria racionalizada, que foi criada a partir de estudos com empresas do setor privado na Escola Politécnica da USP é um capítulo à parte. Elevou a condição das vedações de alvenaria de sistemas arcaicos e ultrapassados, como ainda é visto e usado em muitos locais, para um sistema altamente eficiente e competitivo, resultando em paredes de baixo custo e alto desempenho. A ideia da alvenaria racionalizada é a de usar os princípios básicos da engenharia para a produção da vedação, ou seja, planejamento das etapas, projeto de produção detalhado e compatibilizado com os demais sistemas, mão de obra treinada e seguindo padrões de execução pré-definidos e controle da qualidade das etapas de produção e dos produtos finais. Assim, se substitui a situação da obra tradicional, onde as decisões são tomadas na obra, sem visão geral, com grande nível de improviso e retrabalho.
Como é o mercado em geral para os materiais cerâmicos? Tem algum campo em que você observa um maior crescimento?
Na minha opinião, a indústria de blocos cerâmicos ficou um pouco atrás dos produtores de outros componentes, pois num longo período os melhores produtores focaram quase que exclusivamente na alvenaria de vedação racionalizada. Hoje, vemos a iniciativa de alguns grupos e produtores em desenvolver componentes específicos para alvenaria estrutural, para que se possa utilizar em edifícios de maior altura. Na vedação, o mercado é muito diversificado, além de ser o mais tradicional. Quando pensamos no país como um todo talvez o grande desafio ainda seja aumentar o nível de conformidade, para que num segundo momento seja difundido no país inteiro a ideia de alvenaria racionalizada.
Em relação a questão da escolha de materiais que serão usados na construção, como se dá a troca de informações entre a execução da obra e o desenvolvimento do projeto?
Como coloquei anteriormente essa troca de informações deve acontecer logo nas primeiras etapas de projeto. Com blocos que são normalizados, isso fica facilitado, pois o projeto não precisa ser desenvolvido para um produtor específico, mas para uma linha de produtos que pode ser fabricada por diversos produtores. É importante que o projeto de produção siga as mesmas etapas das outras disciplinas, interagindo com essas, fazendo sugestões de alteração e escolha de tecnologias. O projeto de produção é uma das principais ferramentas para a difusão de tecnologia na obra.
Na hora de escolher os materiais que usará em um projeto, o que você leva em consideração?
O primeiro aspecto importante é entender se o construtor possui um sistema construtivo definido. Em muitos casos os construtores estabelecem parcerias com fornecedores e ao longo do tempo vão desenvolvendo soluções conjuntas. Quando uma empresa chega nesse nível, parece incrível que num momento as decisões eram tomadas apenas pelo custo unitário dos componentes. Devemos lembrar que a vedação é a chave para organizarmos a obra. São os subsistemas que representam um dos maiores volumes de elementos da construção e fazem interface com vários outros subsistemas: estrutura, esquadrias, revestimentos, impermeabilizações, hidráulica, elétrica, etc. Além disso é decisivo no desempenho do edifício e na prevenção de muitos problemas patológicos.
O que faria você utilizar materiais cerâmicos?
Há muitos aspectos que são importantes na escolha de um componente, que vão das características do produto à experiência e aceitação no mercado. Do ponto de vista da engenharia, entretanto, as principais características são aquelas que permitem a racionalização do sistema: família de componentes modulares; precisão dimensional; soluções para sistemas prediais, soluções para reforços nos pontos necessários, etc.
O que diria aos fabricantes de blocos e telhas cerâmicas para melhorar os produtos ofertados hoje no mercado?
Por muito tempo o fabricante tinha o foco na otimização da produção de seu componente, como se o bloco fosse um produto final acabado. Ele deve lembrar que o produto acabado é o edifício e o foco deve ser na produção do mesmo. Assim, pequenas mudanças podem representar uma diferenciação enorme de seu produto. Por exemplo, um produtor que entregue o seu produto paletizado, da forma como o construtor precisa, vai se diferenciar muito dos demais, mesmo que os outros estejam fazendo exatamente o mesmo tipo de bloco com as mesmas caraterísticas. Quando iniciamos o desenvolvimento de um projeto numa cidade que tem pouca tradição em uso de alvenaria racionalizada, a grande dificuldade é entender o que os fornecedores locais são capazes de oferecer para viabilizar esse projeto, tanto em tipos de componentes diferenciados, como na qualidade dos produtos.
Qual a sua opinião sobre alvenaria estrutural com blocos cerâmicos?
A alvenaria estrutural de blocos cerâmicos, por muito tempo ficou restrita a prédios de pouca altura. Hoje, vemos alguns fabricantes oferecendo produtos diferenciados para permitir o uso em edifícios mais altos. Acho que esse caminho é muito bom. O problema é que há um longo percurso a percorrer até chegar aqui. Outro ponto importante diz respeito a certificação dos produtos, como disse anteriormente. Para a alvenaria estrutural a qualidade e uniformidade da produção é essencial.
O que acha da alvenaria com blocos de concreto?
O setor de fabricantes de bloco de concreto absorveu essa visão da necessidade de desenvolvimento de produtos com foco na produção. A diferença de produzir um componente de baixo custo unitário, vendido como uma commoditie e um componente de um processo produtivo racionalizado, que incorpora uma tecnologia que resolve o problema dos construtores faz toda a diferença. Por isso, vimos nas últimas décadas o bloco de concreto ser empregado com grande desenvoltura mesmo em mercados como o da alvenaria de vedação, que era tradicionalmente feita com blocos cerâmicos. Esse fenômeno se deu com grande força em São Paulo. Será que não acabará ocorrendo em outras praças no Brasil?
Entre os dois sistemas, qual você escolheria para executar uma obra? Por quê?
Não há escolha que seja universal. Muitos são os aspectos da escolha, como pontuei anteriormente é a opinião do construtor que é decisiva, inclusive em função de suas parcerias técnicas e comerciais.
Nos projetos da Arco, qual o material mais utilizado, cerâmica ou concreto? Por quê?
Para alvenaria estrutural, com certeza o bloco de concreto é o mais empregado, por todas as restrições, principalmente para emprego em edifícios mais altos, que existe para a grande maioria dos fabricantes de blocos cerâmicos. Na alvenaria de vedação na região de São Paulo, capital, acho que é bem dividido entre bloco de concreto e bloco cerâmico e no Brasil, como um todo, acho que há a prevalência do uso de blocos cerâmicos.
A sustentabilidade da obra é levada em consideração na hora da escolha dos produtos que irão compor a construção?
Esse tema tem ganhado maior importância nos últimos anos, mas tem sido quase que exclusivamente tratado em grandes empresas, que por algum acordo com órgãos financeiros têm metas de redução de emissão de carbono ou uso de água, ou para aquelas empresas que estão em busca de alguma certificação ambiental para seus empreendimentos.
Em um projeto voltado para habitação social, levando em consideração as necessidades de uma obra rápida, com bom desempenho térmico, durável e de futuras manutenções baratas, que tipo de material você usaria? Por quê?
Como coloquei anteriormente, o essencial não é necessariamente a natureza do material, cerâmico ou concreto, mas as opções de componentes que permitam os aspectos de racionalização e certificação do produto fornecido. Aliás, essa certificação está ficando mais importante a cada dia, e a aderência aos preceitos normativos cada vez mais essencial.
Apesar de serem construções simples e com pequenos orçamentos, é possível agregar sustentabilidade nas habitações de interesse social?
O principal aspecto de sustentabilidade neste caso é a redução de desperdícios conseguida por uma obra bem projetada e planejada. Veja só, quando você não mais precisa “engrossar” revestimentos porque as paredes são planas, alinhadas e aprumadas, ou quando o nível de geração de entulho cai, o que você deixa de gastar com esse desperdício é um ganho expressivo em termos de sustentabilidade, tanto na economia de recursos como na diminuição de resíduos.
Na sua opinião, a contratação de materiais e serviços pelo menor preço pode comprometer a sustentabilidade da construção?
Quando a busca pelo menor preço foca materiais e mão de obra mais baratas, com baixa qualidade, a probabilidade do resultado final ser ruim é muito grande, inclusive quanto à sustentabilidade. Quem pensa em custo tem que pensar mais amplamente, em velocidade de obra, qualidade e ausência de patologias, desempenho adequado, redução de desperdício. Assim, a conta fecha. Essa é a mágica de, mesmo usando materiais “mais caros”, com uma mão de obra qualificada “mais cara”, se conseguir um produto melhor e de menor custo.
A Arco Assessoria em Racionalização Construtiva é uma empresa que atua no mercado há 21 anos, com mais de 1.800 projetos desenvolvidos. A instituição sempre teve como objetivo o desenvolvimento de projetos que agreguem em racionalização e tecnologia para os seus clientes. O foco de trabalho são projetos de vedações verticais, tanto em alvenaria como outros sistemas de vedação, revestimentos e alvenaria estrutural. Os trabalhos são desenvolvidos como “projeto para produção” que tem como objetivo tanto as soluções tecnológicas como o atendimento às necessidades construtivas dos clientes.