Eric Chartiot

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O francês Eric Chartiot possui muitas facetas. Além de ser formado em línguas estrangeiras aplicadas pela Universidade de Lyon, na França, Chartiot é mágico e ator. Extrovertido, gosta também de palestrar: já se apresentou para mais de 700 mil pessoas em suas mais de duas mil conferências, oficinas e espetáculos direcionados às áreas de Trabalho em Equipe, Segurança do Trabalho, Mudança de perspectiva de comportamentos e Atendimento ao Cliente. O autor dos livros “A Melhor Mágica do Mundo”, “Contos Mágicos” e “O Magicontador” encerrará, no dia 18 de setembro, o ciclo das Clínicas Tecnológicas do 44º Encontro Nacional da Indústria de Cerâmica Vermelha, com o tema “A Força da Segurança”.

Por Aline Moura, com colaboração de Laís Napoli | Fotos: Divulgação

Quando e como surgiu a mágica na sua vida?

Tudo começou em 1996 quando eu trabalhava como diretor de cursos do Centro Cultural Francês, em Oslo, Noruega. Minha filha acabava de completar dois anos e decidi aprender uns truques de mágica para brincar com ela. Comprei um livro de mágica para principiantes numa livraria do centro da cidade. Acredito que foi como um vírus (bom!) que me contaminou e nunca mais saiu! Preciso dizer que minha filha não foi contaminada.

De que um mágico precisa para entreter seu público?

Precisaria escrever um livro, ou dois, para responder a esta pergunta. Resumindo ao máximo, eu diria que ele precisa ser interessante, ter bons números, ter um texto cativante e uma boa presença de palco e comunicação. Ele deve saber usar de variação, se concentrar muito no interesse de seu público e conhecer na ponta dos dedos cada segundo de sua apresentação.

Há quanto tempo você apresenta a palestra “A Força da Segurança”? Qual o seu envolvimento com o tema?

Em 2004, depois de apresentar um espetáculo para crianças num parque de Porto Alegre, uma senhora se apresentou, me pedindo para realizar uma palestra sobre Segurança no Trabalho na sua empresa. Eu imediatamente recusei, explicando que eu não tinha nenhum conhecimento do assunto e que não poderia realizar este trabalho. Ela insistiu dizendo que me mandaria toda a informação necessária e que eu só teria que apresentar isso de forma diferente, com mágica. Acabei aceitando o desafio e foi assim que nasceu a minha primeira palestra sobre Segurança no Trabalho. Era muito diferente daquela que faço hoje, pois, com o tempo, fui desenvolvendo outra forma de abordar o tema.

Como você identificou a necessidade de falar sobre Segurança no Trabalho e qual o objetivo que você busca atingir com a palestra?

Como contei antes, não fui bem eu que decidi fazer isso, mas, realmente, depois de realizar a primeira (palestra), eu percebi que existia um campo de trabalho muito grande e interessante no sentido em que podia ser realmente útil para as pessoas. A mágica passava a servir uma causa importante: sensibilizar as pessoas sobre a importância de cuidar da própria segurança no trabalho (e fora dele também). Não tendo formação técnica no assunto, decidi não abordar o tema por este lado e sim procurar conscientizar, tocar emocionalmente as pessoas. Afinal de contas, nós sabemos que a informação técnica só é útil a partir do momento em que as pessoas decidem fazer uso dela. Sem esta conscientização, de nada adianta informar.

Por que apresentar o tema Segurança no Trabalho através da mágica? Como surgiu a ideia?

Já contei como surgiu a ideia e devo dizer que eu fui o primeiro surpreso com os resultados. A mágica, assim como a contação de histórias, que também uso na palestra, coloca as pessoas num estado emocional. Todos nós sabemos que tal mágica não aconteceu realmente, assim como sabemos que o personagem do conto não morreu, mas nos emocionamos, choramos, rimos. A emoção é uma chave que abre a porta da consciência. Se eu consigo fazer as pessoas entenderem emocionalmente as consequências de um acidente no trabalho, o que isto representa para elas, para seus filhos, suas famílias, talvez elas enxerguem a questão de forma diferente e mudem seu comportamento. Sabemos que a imensa maioria dos acidentes no ambiente profissional poderia ter sido evitada com uma simples mudança de comportamento, é isto que procuro atingir.

Qual a sua expectativa para a apresentação que fará no 44º Encontro Nacional da Indústria de Cerâmica Vermelha?

Fiquei muito feliz e honrado com o convite. Eu sei que serão muitas pessoas, profissionais reconhecidos, líderes no seu ramo, mas mesmo assim espero ter a oportunidade de “conversar” realmente com elas, de poder colocá-las no estado emocional que mencionei anteriormente e tocá-las. Tenho certeza que para a maioria dos participantes minha abordagem será totalmente nova e surpreendente, e espero demonstrar a todos o quanto a mágica e a contação de histórias podem ser ferramentas muito poderosas em termos de comunicação e servir causas importantes e nobres como a segurança.

Como lidar com as pessoas que são “resistentes” a este assunto e acreditam que estas palestras têm um efeito passageiro?

Não acredito que uma pessoa possa realmente ser “resistente” ao assunto Segurança no Trabalho. Todos conhecem as consequências dos acidentes no ambiente profissional: no nível humano, primeiramente, ninguém pode dizer que não se importa em ver colegas, funcionários, amigos se machucarem ou até perderem a vida. E no nível econômico, também já está mais do que demonstrado que os custos dos acidentes para a empresa são muito importantes. Todos nós sabemos hoje que o fator humano numa empresa é, e continuará sendo, o mais importante. Uma empresa que investe em prevenção de acidentes ganha em todos os setores. Demonstra a importância que dá aos seus funcionários, valoriza seu lado humano e, além disso, realiza economias, tornando-se mais produtiva e eficiente. Uma palestra tem efeitos passageiros sim, mas pode ser um excelente ponto de partida e cabe aos integrantes da empresa torná-los perenes. É claro que nenhuma palestra, sozinha, vai mudar para sempre a realidade da Segurança do Trabalho numa determinada empresa. De nada serve trazer um palestrante uma vez por ano, seja ele mágico ou não, se não se tem uma preocupação quotidiana com a segurança. Uma palestra não é nada mais que uma pedra que vem ajudar a fortalecer uma construção. Para que esta seja forte, é preciso que muitos colaborem, tragam seu conhecimento, sua força de vontade, de trabalho e de decisão. Existem para isso os profissionais da segurança, CIPAs, líderes, colaboradores, na verdade todos os integrantes que respondem por uma cultura de empresa que coloca a segurança em primeiro lugar.

O trabalho das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPAs) realmente funciona na questão da Segurança do Trabalho ou poderia ser mais atuante? O que falta fazer nessa área?

Desde 2004, tenho visto realidades muito diferentes com relação às CIPAs. Algumas são muito eficientes e outras menos. Acredito que isso dependa mais das pessoas que as integram, da valorização que a empresa dá a elas, e, portanto da cultura da empresa, voltada ou não para a segurança. Eu vi CIPAs que só se preocupam em organizar uma SIPAT (Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho) uma vez por ano e, como disse anteriormente, todos nós sabemos que isto não serve para nada. Por outro lado, eu também vi CIPAs mobilizando o ano inteiro os colaboradores, cobrando os responsáveis para a realização de melhorias, fazendo da segurança uma prioridade e, de novo, uma verdadeira cultura da empresa onde atuam. Eu gosto de dizer que numa empresa todos devem sentir-se presidente da CIPA. A situação ideal é quando cada um tem um nível importante de comprometimento com a segurança de todos. Acredito que seja muito importante envolver todos os colaboradores na melhoria da segurança. Um excelente exemplo: vi numa empresa que pedia a todos para sinalizarem todas as fontes potenciais de acidentes durante o ano. Para isto, existia um sistema de coleta de informações provenientes de todos os funcionários da empresa e, a cada SIPAT, o presidente da CIPA tinha que prestar contas, mostrando o que havia sido feito para cada caso. Tal máquina havia sido mudada, uma grade de proteção havia sido colocada em tal ou tal lugar, um novo EPI havia sido adquirido para tal ou tal atividade etc. Um belo exemplo de envolvimento de todos com a segurança, pois cada um podia sentir que sua ação em prol da segurança de todos gerava resultados reais.

Quais as causas mais comuns de acidentes de trabalho? Como esses acidentes ocorrem?

A gente sabe que o fator humano é sempre o mais importante. Todos os números mostram que em torno de 80% dos acidentes do trabalho poderiam ter sido evitados com uma mudança de comportamento. Desatenção, não respeito das regras, mau uso dos equipamentos etc. Poderíamos dar centenas de exemplos de acidentes resultantes desses fatores.

Muitas vezes as mudanças exigidas pelas normas afetam a cultura de uma empresa e esbarram na resistência dos seus colaboradores. Diante disto, como atuar para sensibilizar tanto os empresários quanto os trabalhadores para a importância da Segurança no Trabalho?

Todos nós queremos mudanças, mas ninguém quer mudar! Infelizmente, a realidade é essa. Por esta razão, na palestra eu abordo muito essa questão mostrando, com dinâmicas simples realizadas por todos, como é difícil mudar de atitude, de comportamento. Melhorar a segurança é muitas vezes sinônimo de mudança e esta é uma das principais razões de resistência. Acredito que todos estão cientes da importância da Segurança no Trabalho, ninguém quer sofrer um acidente, ninguém quer se machucar, por esta razão, meu objetivo não é convencer da importância da segurança e sim mostrar que somos capazes de mudar, de nos adaptar a novas normas, a novos comportamentos. A palestra se chama “A Força da Segurança”, pois tento mostrar que esta deva ser maior que todas as outras (distração, preguiça, hábito etc.) contrárias reunidas.

Algumas cerâmicas promovem cursos internos com Técnico em Segurança para que os colaboradores compreendam e se sensibilizem pela segurança prescrita nas Normas Regulamentadores do Ministério do Trabalho. Quais outras medidas as empresas podem tomar para o cumprimento das normas?

Isto já é um excelente ponto de partida, mas, como disse anteriormente, a empresa tem que criar uma verdadeira cultura da segurança, mostrando que é uma responsabilidade de todos e não unicamente de um técnico, de um presidente de CIPA ou de um empresário. Em minha opinião, se trata de colocar cada colaborador na frente de suas responsabilidades e levar cada um a sair da cultura do “não dá nada”. Quantas vezes vemos comportamentos até infantis com relação à segurança no trabalho, em casa, nas estradas, simplesmente porque as pessoas pensam: “Ah, não dá nada”. Se as 700.000 pessoas que se machucaram nas empresas do Brasil em 2014 tivessem pensado diferente, eu tenho certeza que este número seria muito inferior.

A NR-12 – que trata de Segurança do Trabalho em Máquinas e Equipamentos – está sendo considerada uma norma complexa e difícil atendimento por diversos segmentos da indústria. Como você avalia esta norma e quais medidas as cerâmicas podem tomar para o cumprimento da NR-12?

Como deu para entender nas minhas respostas anteriores, minha abordagem do tema da segurança leva muito mais as pessoas a se conscientizar, a mudar seu comportamento, a se sentir responsáveis pelos outros. Um técnico especializado nas questões normativas poderia responder muito melhor do que eu a esta pergunta.

Que setores da indústria mais se destacam em Segurança no Trabalho? Que lições podem ser absorvidas pelo setor de cerâmica vermelha, considerando suas particularidades?

Acredito que cada setor deve agir em função de suas características próprias. O setor ceramista terá, por exemplo, questões importantes relativas à poeira que não se encontrará em outro. Ao contrário, tal ou tal setor poderá apresentar riscos desconhecidos pelo ceramista. Por isto, me parece que o mais importante é sempre pensar na informação e formação adaptada ao setor com relação ao uso de EPI e sistemas de prevenção adequados. De novo, trata-se de uma verdadeira “Revolução Cultural” em matéria de segurança, pois o principal fator de acidentes é quase sempre a falha humana. Mudar o comportamento não é coisa fácil, mas nada é impossível quando se tem a convicção de que esta é a única saída possível.