Muitas vezes, a história do material se confunde com a própria história da civilização
Por Laís Napoli, sob supervisão de Manuela Souza
A cerâmica existe há cerca de dez mil anos e é o material mais antigo produzido pelo homem. Do grego “kéramos”, seu nome significa “terra queimada” ou “argila queimada”. Por ser um material de imensa resistência, é frequentemente encontrado em escavações arqueológicas e, dessa forma, a história da cerâmica confunde-se com a própria história da civilização. Os vasos e as taças, por exemplo, são, em muitos casos, os únicos elementos sobre os quais se pode reconstruir o grau de evolução, os hábitos, a religião e até as mudanças de povos já desaparecidos.
Simplificando o processo de obtenção do material, a cerâmica é uma atividade de produção de artefatos a partir da argila, que se torna plástica e de fácil modelagem quando umedecida. Após ser submetida à secagem, para retirar a maior parte da água, a peça moldada é submetida a altas temperaturas, a partir de 800ºC, que lhe atribuem rigidez e resistência.
Assim, a cerâmica pode ser tanto utilizada como uma atividade artística, em que são produzidos utensílios com valor estético, quanto como uma atividade industrial, em que são produzidos artefatos para uso na construção civil e na engenharia.
Hoje em dia, além de sua utilização como matéria-prima de diversos instrumentos domésticos, da construção civil e como material plástico nas mãos dos artistas, a cerâmica é também utilizada na tecnologia de ponta. A fabricação de componentes de foguetes espaciais, por exemplo, requer o uso de cerâmica, justamente por causa de sua durabilidade e resistência.
Primórdios da cerâmica
Quando saiu das cavernas e se tornou um agricultor, o homem precisava de outros meios de subsistência além de um abrigo. Logo, surgiu a necessidade de ter também vasilhas para armazenamento de água, alimentos e sementes para a próxima safra. Tais objetos tinham que ser resistentes ao uso, impermeáveis à umidade e de fácil fabricação – qualidades inerentes à argila. Além disso, a cerâmica mostrou-se muito eficiente na construção de casas.
As primeiras cerâmicas que se têm notícia são da Pré-História: vasos de barro, sem asa, que tinham cor de argila natural ou eram escurecidas por óxidos de ferro. Por outro lado, a cerâmica para a construção e a cerâmica artística com características industriais só ocorreu na Antiguidade, em grandes centros comerciais. Após a Revolução Industrial, iniciou-se uma nova e vigorosa etapa de evolução, estendida até hoje.
Estudiosos confirmam ser, realmente, a cerâmica a mais antiga das indústrias, pois ela nasceu no momento em que o homem começou a utilizar-se do barro endurecido pelo fogo. Desse processo de endurecimento, obtido casualmente, evoluiu até os dias de hoje. A cerâmica passou, assim, a substituir a pedra trabalhada, a madeira e mesmo utensílios domésticos feitos de frutos.
A durabilidade da cerâmica pode ser constatada pelo aspecto praticamente inalterado de construções de antigas civilizações, descobertas por arqueólogos, e de alguns objetos, como pratos e vasos. A técnica construtiva em alvenaria de tijolos ou blocos cerâmicos remonta aos antigos caldeus e assírios, que em torno de 4000 a.C. já usavam este material para erguer casas e palácios.
A cerâmica no Brasil: índios da Ilha do Marajó
No Brasil, a cerâmica tem seus primeiros registros na Ilha de Marajó (PA), a partir da avançada cultura indígena que floresceu no local. O material ali produzido era altamente elaborado e de uma especialização artesanal que compreendia várias técnicas: raspagem, incisão, excisão e pintura.
Mesmo desconhecendo o torno e operando com instrumentos rudimentares, o índio da Ilha do Marajó conseguiu criar uma cerâmica de valor, que mostra uma superação dos estágios primitivos da Idade da Pedra e do Bronze.
Percebe-se, portanto, que a tradição ceramista não chegou ao Brasil com os portugueses, em 1500, ou veio na bagagem cultural dos escravos. Os índios já haviam firmado a cultura do trabalho em barro. Por isso, os colonizadores, apenas estruturaram o setor e concentraram a mão de obra, ao instalarem as primeiras olarias em terras brasileiras.
Iniciou-se, a partir daí, um desenvolvimento mais acelerado do segmento. O rudimentar processo aborígine, no entanto, sofreu modificações com as instalações de olarias nos colégios, engenhos e fazendas jesuítas, onde se produziam, além de tijolos e telhas, também louça de barro para consumo diário. A introdução de uso do torno e das “rodadeiras” foi a mais importante dessas influências. Com essa técnica, passou a haver maior simetria na forma e a produção de acabamentos mais perfeitos, com um menor tempo de trabalho.
Em 1575, há indícios do uso de telhas na formação da vila que viria a ser a cidade de São Paulo/SP. Portanto, a partir desse estímulo, começa o desenvolvimento da atividade cerâmica de forma mais intensa no Brasil, sendo as olarias o marco inicial da indústria em São Paulo.
A primeira grande fábrica de produtos cerâmicos do País foi fundada também em São Paulo, em 1893, por quatro irmãos franceses, naturais de Marselha. Com o nome de “Estabelecimentos Sacoman Frères”, posteriormente alterado para “Cerâmica Sacoman S.A.”, a empresa encerrou suas atividades em 1956. O nome das telhas conhecidas por “francesas” ou “marselhesas” é devido à origem destes empresários.
O setor cerâmico hoje
Nos últimos anos, acompanhando a Revolução industrial, a indústria cerâmica adotou a produção em massa, garantida pela indústria de equipamentos e a introdução de técnicas de gestão, incluindo o controle de matérias-primas, dos processos e dos produtos fabricados.
O setor cerâmico, na atualidade, pode ser subdivido em diversos segmentos, que possuem características bastante individualizadas. O mais famoso é o de cerâmica vermelha, que compreende materiais com coloração avermelhada e são empregados na construção civil (tijolos, blocos, telhas, elementos vazados, lajes, tubos cerâmicos e argilas expandidas). Há também a cerâmica branca, a cerâmica de alta tecnologia, os revestimentos cerâmicos, além de a matéria-prima poder ser usada também como material refratário e isolante térmico.
De acordo com o IBGE, em 2008, havia cerca de 7.000 cerâmicas no Brasil. A geração de empregos diretos é em torno de 293 mil, enquanto os indiretos chegam a 900 mil. O faturamento anual é de R$ 18 bilhões, e o setor representa por volta de 4,8% da indústria da construção civil.